O Comef (Comitê de Estabilidade Financeira) do Banco Central disse nesta quinta-feira (9), em ata da última reunião, que simulações de cenários extemos mostram que uma eventual quebra de confiança no regime fiscal teria o impacto mais severo para o sistema financeiro nacional.
O colegiado do BC, entretanto, ressaltou que os resultados dos testes de estresse demonstram que sistema está resiliente.
"Os resultados dos testes de estresse demonstram que o sistema está resiliente. Nos cenários de estresse macroeconômico avaliados, descritos no Relatório de Estabilidade Financeira, o sistema não apresentaria desenquadramentos relevantes", disse.
"Desde a última reunião do Comef, a elevação da incerteza ampliou o impacto no sistema. O impacto mais severo continua sendo o observado no cenário de quebra de confiança no regime fiscal. Teste de análise de sensibilidade verificou que mesmo que os ativos problemáticos dobrassem em relação a seus níveis atuais, o sistema não apresentaria desenquadramentos relevantes", continuou.
A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet (MDB), se reuniu com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), nesta quinta para discutir o desenho da nova regra fiscal, que substituirá o teto de gastos -mecanismo que limita o crescimento das despesas públicas à inflação registrada no ano anterior.
Sem dar detalhes do formato do futuro arcabouço fiscal, Tebet afirmou que a proposta engloba tanto a preocupação em zerar o déficit fiscal do Brasil, estimado em cerca de R$ 230 bilhões neste ano, e em estabilizar a dívida/PIB quanto a demanda do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para investimentos.
De acordo com a ministra, o modelo vai "agradar a todos, inclusive ao mercado [financeiro]". Por interferir de forma direta nas expectativas em torno da trajetória para as contas públicas ao longo dos próximos anos, o tema é bastante aguardado por economistas da iniciativa privada.
Na ata do Comef, o BC também observou que houve recuo da rentabilidade do sistema devido às provisões das instituições financeiras expostas ao caso Americanas. A varejista entrou em recuperação judicial com dívidas que superam R$ 40 bilhões, na esteira da revelação de um rombo contábil divulgado em 11 de janeiro deste ano.
A autoridade monetária destacou no documento que "parcela significativa" das provisões -mecanismo contábil que mantém recursos em caixa para que sejam supridas despesas que ainda não ocorreram- que aparecem nos balanços das instituições financeiras do último trimestre de 2022 "decorre de evento específico relacionado a empresa de grande porte", sem citar nominalmente a Americanas.
"Essas provisões respondem por porção relevante do recuo da rentabilidade anual do SFN [Sistema Financeiro Nacional] e já absorveram a maior parte da materialização do risco", afirmou o colegiado no documento.
O BC disse ainda que estimou o impacto potencial remanescente do caso Americanas em um cenário extremo, no qual haveria contágio sobre toda a cadeia de produção e fornecimento que depende de forma relevante da varejista.
Segundo avaliação do Comef, o impacto para o sistema nesse contexto "é insignificante e não se verificaria desenquadramento de capital em qualquer instituição financeira".
Ainda de acordo com o comitê, a rentabilidade do Sistema Financeiro Nacional permanece pressionada por "redução da margem de crédito, baixo crescimento das receitas de serviço e crescimento das despesas administrativas devido à inflação."
Um eventual "efeito dominó" do caso Americanas acendeu o alerta de analistas e de membros do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre os impactos na economia.
Entre os pontos de atenção em relação ao crédito, o Comef alertou para a deterioração nos preços de ativos no mercado de títulos privados devido a "eventos pontuais" de empresas de grande porte.
"Em decorrência desses eventos, a volatilidade, os spreads [diferença entre o custo de captação dos bancos e a taxa final cobrada do cliente] e a aversão ao risco aumentaram. Também foram observados efeitos em algumas linhas no mercado de crédito", disse.
O comitê afirmou que tem acompanhado a evolução e os desdobramentos dos eventos recentes e se disse "pronto para atuar em caso de disfuncionalidade".
Na ata, o BC afirmou ainda que o apetite ao risco das instituições financeiras na concessão de crédito às famílias e às empresas de menor porte permanece elevado, ainda que tenha apresentado redução.
"Embora em desaceleração, o ritmo de crescimento segue alto em modalidades mais arriscadas, como cartão de crédito e crédito não-consignado, o que requer mais atenção em um ambiente de maior comprometimento de renda e endividamento das famílias", disse.
Dados da Serasa Experian mostram que o número de pessoas inadimplentes começou a subir em setembro de 2021 e não parou mais. Atualmente, são 70 milhões de consumidores e 6,4 milhões de empresas com dificuldades para pagar as contas em atraso.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, as concessões de novos empréstimos e financiamentos para empresas recuaram em janeiro, segundo dados divulgados pelo BC no fim de fevereiro.
Apesar dos alertas, a instância do BC focada na prevenção de riscos sistêmicos considera que as instituições financeiras continuam se mostrando capazes de absorver a materialização do risco de crédito e que os preços dos ativos e o crescimento do crédito não representam preocupação no médio prazo, embora existam incertezas a serem acompanhadas.
Segundo o colegiado da autoridade monetária, o sistema financeiro está preparado para enfrentar eventuais problemas, não havendo necessidade de ajustes na política macroprudencial no curto prazo.
Por Bahia Noticias