Como novas regras sobre sites de compras devem impactar seu bolso
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Publicado em 13/04/2023
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Foto: Getty Images via BBC
Com a justificativa de proteger a indústria nacional e aumentar sua arrecadação, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva pretende adotar algumas medidas que podem encarecer as compras internacionais online.
As mudanças teriam potencial de impactar os preços de sites como Shein, Shopee, AliExpress e Amazon, que operam como marketplaces, plataformas para diferentes produtores (brasileiros ou estrangeiros) venderem seus produtos.
As empresas, porém, refutam as acusações de ilegalidades (veja os posicionamentos completos ao final da reportagem).
Sem citar sites específicos, o governo alega que esse setor tem cometido fraudes para deixar de pagar o imposto de 60% sobre produtos importados.
Para combater essa possível sonegação, a Receita Federal vai intensificar a fiscalização na entrada desses produtos no país.
Além disso, o Ministério da Fazenda decidiu acabar com a isenção do imposto de importação que havia para o envio de mercadorias de até US$ 50 entre pessoas físicas.
O argumento do governo para passar a taxar esses itens é que produtos vendidos nesses sites internacionais estariam sendo enviados ao país como se fossem remetidos por pessoas físicas, uma fraude que dificultaria a atuação dos fiscais da Receita na identificação do que deve ser taxado.
Diante da impopularidade da medida, o governo tem sustentado que não se trata de criar um imposto sobre esses sites internacionais, mas fazer valer a tributação que está sendo burlada.
A intenção da pasta é aprovar uma lei "para que o exportador tenha que prestar declaração antecipada com dados do exportador e de quem compra, além do produto".
A proposta será encaminhada ao Congresso por meio de Medida Provisória, uma lei que tem validade imediata, mas que precisa ser aprovada pelos parlamentares para se tornar permanente.
"Com as alterações anunciadas, não haverá qualquer mudança para quem, atualmente, compra e vende legalmente pela internet", afirmou o Ministério da Fazenda em nota à imprensa.
"As mudanças vão beneficiar o consumidor, que vai receber suas compras on-line mais rápido, com mais segurança e qualidade. Isso porque os produtos terão o processo de liberação agilizado, a partir das informações prestadas pelo vendedor legal, enquanto ainda estiverem em trânsito para o país", acrescentou pasta.
No entanto, o resultado prático deve ser o encarecimento dos produtos para o consumidor final, acredita o vice-presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita (Unafisco), Kleber Cabral, já que as empresas passarão a pagar o imposto que estava sendo sonegado.
Na sua avaliação, isso deve provocar uma queda no consumo online internacional.
"A Receita Federal não consegue separar um caso (itens enviados por pessoa física) do outro (produtos vendidos por empresas) adequadamente. Aplica uma amostragem (para fiscalizar uma parte do que entre no país), com perda de arrecadação e prejuízo ao comércio varejista nacional, que sofre concorrência desleal dessas e-commerce", afirma Cabral.
Qual impacto no bolso do consumidor?
O imposto de 60% cobrado sobre importados incide não só sobre o valor produto, mas também sobre outros custos da compra, como frete ou algum seguro adquirido na transação.
Por exemplo, se uma pessoa gasta em uma compra online no exterior o total de US$ 10 (cerca de R$ 50, na cotação atual), o imposto a ser pago pela importação é de US$ 6 (cerca de R$ 30).
Com o fim da isenção para pessoas físicas, a mesma taxa vai incidir também sobre qualquer item enviado do exterior por algum amigo ou familiar, por exemplo.
Devido à repercussão ruim nas redes sociais, a primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja, minimizou em um post no Twitter o impacto para o consumidor.
"Tô aqui no avião com o Ministro Haddad que me explicou direitinho essa história da taxação. Se trata de combater sonegação das empresas e não taxar as pessoas de compram", escreveu Janja, durante voo para China com o presidente Lula e uma comitiva de ministros e parlamentares.
No entanto, a tendência é que a taxação sobre as empresas seja repassada ao consumidor final, nota Kleber Cabral, da Unafisco.
"Lógico que fica mais caro. Os varejistas internacionais obviamente que vão repassar o custo disso e vai ficar na mão do consumidor final", disse.
A decisão do governo de adotar essas medidas responde a uma pressão de empresas nacionais, que acusam os sites de vendas internacionais de realizar "contrabando digital", numa concorrência desleal.
Um dos empresários que tem liderado esse movimento é Luciano Hang, dono das lojas Havan. Apesar da sua proximidade com o ex-presidente Jair Bolsonaro, a demanda não emplacou no governo anterior.
Além da justificativa de proteger empresas brasileiras, a Fazenda estima que as novas medidas podem render até R$ 8 bilhões ao ano em arrecadação, valor que ajudaria a reduzir o rombo nas contas públicas.
Compras internacionais mais que triplicaram
As compras internacionais mais do que triplicaram entre 2018 e 2021 no Brasil, de acordo com o Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV), uma associação de empresas do setor.
Dados da consultoria NielsenIQ Ebit apontam que essas transações passaram de R$ 7,7 bilhões para R$ 36,2 bilhões neste período. A estimativa é de que tenham chegado a 50 bilhões em 2022.
Shein e AliExpress (da China) e Shopee (de Singapura) são as três principais empresas desse mercado no Brasil hoje, segundo Alberto Sorrentino, consultor especialista em varejo e fundador da Varese Retail.
Essas companhias, porém, refutam as acusações de "contrabando digital".
A Shopee afirma que mais de 85% das suas vendas são de vendedores brasileiros.
"As possíveis mudanças tributárias em compras internacionais NÃO AFETARÃO os consumidores Shopee que compram dos nossos mais de 3 milhões de vendedores brasileiros registrados em nosso marketplace", disse a empresa por meio de nota.
"A Shopee está no Brasil desde 2019, tem dois escritórios na cidade de São Paulo e emprega mais de 3 mil colaboradores diretos. Além disso, a taxação que está sendo discutida vale para compras internacionais de forma geral e não apenas para plataformas asiáticas. Temos origem em Singapura, mas nosso foco é local", acrescentou a empresa.
A Shopee disse ainda concordar com o governo "em qualquer mudança tributária que apoia o empreendedorismo brasileiro, pois também compartilhamos do mesmo propósito e queremos contribuir com o desenvolvimento do ecossistema local".
A AliExpress, por sua vez, respondeu à BBC News Brasil que "cumprir as regulamentações dos locais onde operamos é nossa principal prioridade".
A empresa disse ainda ser "um marketplace global que conecta compradores e vendedores de todo o mundo" e que "tem o compromisso de fornecer aos consumidores brasileiros produtos de qualidade e participar ativamente no desenvolvimento da economia digital local".
A Amazon não quis se manifestar, enquanto a Shein não respondeu até a publicação da reportagem.
Por G1 Globo